Monday, October 23, 2006

O desconhecido viajante sem nome

São sete e meia da manhã e o sol insiste em continuar escondido no horizonte. Pela janela do comboio, algumas luzes de cidades desconhecidas confundem-se com o reflexo do interior do trem, continuando a esconder os mistérios que este país reservam ao desconhecido viajante. Viaja em direção à Espanha e ao encanto de suas mulheres, suas paisagens e seu idioma. Logo chega à sua primeira parada, puto da vida, mas sem nunca xingar em vão. Diferentemente do que o homem da estação o tinha dito, seu trem só partiria de Nine uma hora depois do previsto. òtima hora para conhecer um café tipicamente provinciano, o cheiro de umidade das constuções antigas toma conta do ambiente, enquanto velhinhos de 250 anos xingam palavrões que nem mesmo o mais sem noção dos moleques de rua teria coragem de dizer em público:
-Essa autoestrada vai ter portagem? Foooooooooooda-se!

Um café mais amargo que o normal e de volta à estação à espera do trem que o levaria a Vigo. Logo na plataforma, troca olhares com um gringo com cara de panaca. E como panaca se reconhece à distância, logo os dois estão trocando idéias. Gianlucca viajava à Santiago de Compostela, onde pegaria o avião para Roma. Estava à espera de um amigo, que havia falhado a hora do encontro em Braga. Conversava em português, mas, à primeira dificuldade encontrada, desembestava a falar italiano, misturando loucamente os dois idiomas. Além da cara de panaca, parecia muito preocupado com o amigo, que não poderia de maneira alguma perder o vôo para a Itália. O protagonista agora olha pela janela do trem e vê vinhas e mais vinhas, além de casinhas que o trazem lembranças de seu lar. Pensa em sua família, irmãos, mãe pai e o caralho. Pela primeira vez depois de mais de um mês viajando ele quase chora. Seus olhos se enchem, a garganta trava e ele quase chora. Mas levava um sorriso no rosto, forte o suficiente para fazerem suas lágrimas secarem rapidamente dentro de seus olhos.

Nosso viajante desconhecido chega a Vigo e logo ao sair da estação de trem escuta um "hijo de puta" em alto e bom som dito por uma bela mulher, que ao olhar sua cara de espanto, logo pede desculpas. Apenas um petisco do vocabulário espanhol, oq ue foi notar mais tarde ao conhecer os nativos a dizer coisas como "foder" e "coño" como dizemos olá e boa tarde. Uma ida ao Consulado português e a aquisação da legalidade em território europeu, logo era hora de retornar à estação parta seguir destino a Santiago. Logo depois de comprar o bilhete, heis que surge à porta da estação um colega de intercâmbio, Roberto, italiano, com uma cara de sono que até um cego reconheceria de longe. Estava tudo explicado, ele era o companheiro de viagem de Gianlucca. Balada muito forte na quinta-feira e o resultado foi o furo com o amigo. Sorte que havia outro italiano disposto a dirigir até Vigo para garanir o embarque para Roma e sua festa de aniversário. "O mundo é mesmo um ovo... E de codorna!", pensou nosso solitário viajante.

O encontro, além de inesperado e curioso, rendeu-lhe, além de compania, um bom som a ser compartilhado em um fone de um iPod. O som toca Africa Bambaata e a paisagem passando rapidamente na janela do trem compõem uma longa viagem no tempo. Planet Rock é a trilha sonora de seu caminho a Santiago, para onde ia encontrar o que de mais precioso já havia tido em sua vida. E ela estava lá, à sua espera na estação de trem. Vestida de branco, o mesmo sorriso, o mesmo abraço e o mesmo beijo, em outro lugar do mundo, bem distantes da Alameda Santos. Não sabia se o mundo era, ou é, feito de coincidências ou semelhanças, apenas queria viver ao máximo aqueles breves e eternos momentos que lhes foram proporcionados. Depois desses mágicos momentos e de uma pausa para um "churros con chocolate", é hora de nosso famoso viajante partir de volta a terras portuguesas. Voltar para o lugar ainda onde se bebem cervejas por 70 centimos. Para um lugar onde se fuma à vontade em qualquer lugar que se vá.

Mas não sem antes se despedir. Entra no trem, ocupa o lugar mais longe de todos os outros passageiros e, depois de mexer em sua mala, apenas para passar o infinito espaço de tempo que 2 minutos levam para passar em tempos de despedida, olha para a janela e vê ela, plácida, olhando, parece que há muito tempo, para ele. Ele devolve o olhar. E a fita por intermináveis segundos. Mais uma vez o choro ameaça lavar seu rosto. Mais uma vez seus olhos estão mareados. Mais uma vez a garganta dura. E mais uma vez seu sorriso o impede de chorar.

Não estou ouvindo, mas recomendo:
AC/DC - Can I sit next to you

Ouvindo: Dire Straits - Tunnel of Love

7 comments:

Anonymous said...

Tunnel of Love é muito bom. Sempre.

Anonymous said...

gostei, gostei muito!

Roger de Lima said...

Percebe-se que Bigode é um grande fã de AC/DC!

lau2m said...

;)

Bigode said...

Tunnel of Love é animal, principalmente pelos últimos versos.
Fico orgulhoso do comentário da Li, vindo de uma editorzinha, é realmente um orgulho.
AC/DC rules.
E, por fim,
:*

Anonymous said...

Puta saudade de você agora, mano...é tudo o que eu consigo dizer...se cuida aí e volta logo!
Abração!

Bigode said...

uõ!