Friday, April 29, 2011

Sobre curuiz, calaboca, cuspião e outras histórias

-Calaboca! Pega!

Falava sempre baixinho, fechando minha mão, bem maior que a dela, colocando dentro a notinha suada de 5 reais.

-É pra você tomar um sorlvete.

Falava sorlvete, como os mais cultos falam Marlboro. Falava 'cuspião' no lugar de escorpião. Falava que a barata viria 'lember minha boca' caso não escovasse os dentes.

Do alto de seu metro e pouco, com as costas curvadas pela vida, encantadora pela fragilidade, encantadora pela força e alegria inocente de viver.

Pouco estudara, o suficiente para escrever um cartão por ano, em português quase inventado. Sempre do fundo do coração.

Lembra-se sempre, e quando digo sempre, quero dizer sempre mesmo, de quando dava banho em mim. "Agora eu não consigo nem levantar uma perna sua". E ria que ria, sempre um riso alegre e contido com a mão à frente da boca.

-Curuiz!

Nunca disse 'cruz credo' ou coisa assim. Só falava 'curuiz'. E eu amando tudo isso.

Dói, por isso é hermético. Curuiz se você for embora agora. Fica.

Ouvindo: Ratos de Porão - Medo de Morrer

3 comments:

lau2m said...

fiquem bem.

Bigode said...

Ela vai segurar a onda. Só precisava exorcizar o medo por aqui.

Valeu pela força, viu?

Anonymous said...

Muito lindo!!! bela homenagem!