Estava encostado à beira do balcão, camisa larga em cima, apertada na barriga, deixando quem olhava por baixo ver o seu umbigo rodeado de pêlos. Chega um homem, tipo descolado que arruma tudo o que quer:
- Escuta, você não tem um real aí pra me arrumar?
Vacila ao levar o copo de velhobarreiro com limão à boca, pousa o copo no balcão e responde sem encarar o malandro:
- Tenho não.
- E um cigarrinho você teria, né não?
- Não fumo.
O vizinho de boteco estende um cigarro para o malandro, também sem olhar pra cara de nenhum dos dois, sem vontade de entrar naquele papo furado. O malandro pega o cigarro orientado pelo rabo de olho, sem olhar pro generoso vizinho e continua interpelando o homem de barriga de fora:
- ´presta um fósforo aí!
- Não tenho. Não fumo, tenho fósforo não.
O dono da bodega estende o isqueiro, mais uma vez sem olhar pro pedinte. O pedinte acende o cigarro sem olhar para o homem atrás do balcão. Traga fundo, assopra com o canto da boca e olha para nosso personagem sem fixar ponto em seu rosto.
-Posso dar um gole aí, então?
- Vai lá.
O malandro mata a cachaça em um gole só, limpa a boca com as costas da mão e solta algo gutural como um 'aaaaiiii'. Cospe no chão da calçada enquanto o primeiro homem pede uma recarga de cachaça com limão. O malandro termina de fumar, jogando a bituca com maestria para o exato meio da rua. Pede mais uma vez:
- Tem uma bala aí, moço?
- Tenho não senhor.
O malandro olha encabulado, pensativo. Do nada, solta mais uma:
- E um colírio, o senhor teria aí?
- Tenho sim.
- Então pinga dois aqui, ó - diz o malandro enquanto tomba a cabeça para trás e abre as pálpebras com os dedos.
Ouvindo: IAM - Ça Vient de la Rue
O que é “puxa saco”?
10 months ago
2 comments:
Hahahaha! Muito boa essa história.
Há muito tempo que ouço falar daqueles dois pingos de colírio...
Beijos!
Verdade cumpadi?
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