Wednesday, March 23, 2011

Homem é homem, mulher é mulher...

Depois de passar o corredor da carceragem do 3º DP aos berros de 'me bota aqui não, dotor', Gilsinho foi atirado pra dentro da cela nº 2, com capacidade para 6 detentos, mas que na época suportava 22. Cientes do boato que o novato tinha caído no artigo 213, os habitantes da cela estavam mais que ouriçados. 'Aê, já era, esse aí é meu'. 'Passa o rabo dele pra cá'. 'Vai morrê, cuzão!'. Cocão, o dono da cela, tratou de acalmar a família. Com o indicador cruzado na frente dos lábios, fez shhhhhhh e todos calaram. 'Vem cá que eu quero te dar um papo, irmão'.

Gilsinho não para de tremer e está todo mijado, além de escoriações múltiplas pelo corpo, cara inchada e sangue seco e craquelado por toda a sua pele. Não se pode dizer que ele se acalma, mas o simples fato de todos obedecerem ao pedido do chefe da cela o deixa menos apavorado. Cocão dá a palavra, num tom relaxado e curioso:

- E aí, irmão, caiu no 213?
- Foi sim.
- Conta aí como foi...
- Pô, como assim. Tô arrependido, já apanhei que nem cavalo...
- Fala aí, irmão, como foi, rebentou a menina na piroca?
- Pois é...
- Então essa vai ser a gozada mais cara da tua vida, rapá. Aê Nelsinho, chega mais, busca a roupa dele lá!

Todos os detentos comemoram em alto e bom som.

Nelsinho é o braço direito de Cocão, odediente como um cão perdigueiro. A 'roupa' é uma calcinha de fio dental, costurada pelos travestis da cela 3, reforçada nas costuras, resistente e rendada. Parece que Gilsinho se mijou mais uma vez. Nelsinho encontra a calcinha embaixo de seu colchão e joga na mão do novato. 'Veste essa porra aí, mermão'.

Cordas de varal, camisinhas, lanternas, é inacreditável a quantidade e variedade de coisas que os detentos conseguem colecionar em seu cotidiano moroso. A família pendura Gilsinho na grade, os pés distantes um palmo do chão. Está preso de frente para as grades, amarrado pela frente da calcinha. 'Nelsinho, tem que lavar esse porra aí, mano'. A ordem de Cocão é cumprida em segundos com uma ou duas canecadas de água na linha da cintura do detento. 'Hoje vamo brincar de poste, moçada. Quem vai primeiro?'

Nelsinho levanta a mão e logo pede ao patrão: 'Posso rabiscar no poste, Cocão?'. Permissão dada, Nelsinho pega a gilete e escreve, começando as palavras entre os ombros de Gilsinho e terminando na lombar:

"Familia 3º DP  
Estrupado é diferente
Sem perdão
Rabo da geral"

Enquanto o sangue escorre, Nelsinho se prepara para sodomizá-lo. Enquanto o faz, faz juras de amor eterno à noiva da cela. 'Agora tu é nossa, vai servir a geral aqui. Fica calmo, você ainda se acostuma e gosta, menina'. Os outros detentos fazem um burburinho na tentativa de organizar uma fila. Xeroso, o mais jovem dos prisioneiros, fica de canto, desinteressado da brincadeira dos irmão. Cocão logo vê e ordena: 'Tu é o próximo lá, irmãozim'. 'Gosto de cu de homem não, Cocão, na boa.' 'E quem falou que essa porra ai é homem? Tu é o próximo'.

Gilsinho só se lembra da história até aí e é isso que ele conta para o delegado Matoso, entre soluços e tremedeiras. Gilsinho implora com toda a sua emoção para que seja colocado no seguro.

Ouvindo: IAM - La Fin de Leur Monde

Monday, March 21, 2011

Pílulas do cotidiano na metrópole

Tem um carro parado no cruzamento, sem semáforo, só a faixa de pedestres mesmo. Uma mulher de cada lado da rua, prontas para atravessar. O motorista fala algo para menina que vem de lá. Linda, coisa gostosa, maravilha. O carro passa e vai embora. A menina que vem de cá entreolha a que vem de lá. 'Idiota'. 'Sem vergonha'. Cada uma elogia o motorista à sua maneira, se entreolham já de canto de olho. Nunca mais se verão.


Uma mulher velha, bem velha está parada dentro do ônibus, ocupa todo o espaço possível para quem entra no ônibus. Ela vai descer no quarto ponto a partir do começo da história. O moço entra apressado, porém, educado. Quer passar, a velha quer ficar ali parada. O moço xinga baixinho, esbarra propositadamente na velha. Quando o moço lembra do caso, a velha já desceu.


Um homem está sentado no restaurante, desses onde come-se o que se quer por um preço único. Senta-se e come tranquilo. Uma mulher aparece na mesa em frente, mas eram três mesas de distância entre os dois. Olham um para o outro alternadamente. Os olhares não se cruzam. Enquanto pensa em com eram bonitos os cabelos da mulher, derruba feijão em seu colo. Xinga em silêncio e pragueja, enquanto a mulher estende o braço pedindo a conta.


O moleque anda na rua distraído, cheio de som em seus ouvidos. Escuta seu mp3 player no volume máximo. O cachorro parecia quieto e calmo. O menino não faz menção de afastar-se do cão. Abruptamente, o cão dá o bote e trava a mandíbula na perna do moleque. O dono do animal aparece e culpa o menino pelo ataque.


Um homem sentado ao lado de um monte de lixo arruma seu isqueiro, testa, risca, risca, risca. Parece que agora funciona. Seleciona um pedaço de papel alumínio no meio da lixeira. O homem tem algo precioso bem seguro entre o polegar e o indicador da outra mão. Parece que vai fumar uma pedra.


Tem um homem parado no cruzamento. Depois de muito vacilar, resolve atravessar a rua, confiante no sinal fechado. Caminha decidido rumo ao outro lado da rua. Um carro passa e leva o homem aos ares. O homem cai desacordado. Duas mulheres viram a cena, cada uma de um lado da rua. As duas caminham em direção ao homem. 'Coitado'. 'Filho da puta'. A segunda falava do motorista, não do atropelado. Após testemunharem o acidente diante da polícia, cada uma toma seu rumo, certas de que nunca mais se verão.


Colaborações: você pode deixar sua cena nos comentários que eu publico aqui:


Um menino está bebendo uma breja com amigos na faculdade. Chega uma louca com uma bolsa e tenta seduzi-lo. O menino nega o beijo da linda desconhecida e toma 3 bolsadas na cara.


Três homens na 'cabine' de um caminhão estão transportando algum tipo de produto para abastecer algum tipo de comércio. Uma mulher desce a rua ao mesmo tempo que o caminhão sobe. Ao olhar sem pretensão alguma para o veículo, avista o motorista tapando a boca, o companheiro ao lado tapando os olhos, e o terceiro tapando os ouvidos. E o caminhão e a moça seguem seus rumos.


A mulher de meia idade chega sozinha ao bar. Vê duas lésbicas se beijarem e pergunta a um homem sozinho como ela se não quer fazer igual. Ele diz que não. A mulher de meia idade não se abala, pois mora ali do lado e só foi ao bar para encher a cara.

Ouvindo: Birdy Nam Nam - Love your Enemy